Cluster One - Pink Floyd

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Corvos

“Open here I flung the shutter, when, with many a flirt and flutter,
In there stepped a stately raven of the saintly days of yore;
Not the least obeisance made he; not a minute stopped or stayed he;
But, with mien of lord or lady, perched above my chamber door-
Perched upon a bust of Pallas just above my chamber door-
     Perched, and sat, and nothing more.”

— Edgar Allan Poe.

Já sabemos do ar melancólico e terrível inscrito nas palavras de Edgar Allan Poe. O fragmento acima, retirei do seu poema mais célebre, O Corvo, e acredito ser interessante para abrir o assunto a ser tratado. Para aqueles que não estão habituados com o inglês, não faltaram tradutores em resgate. O texto já foi traduzido por Machado de Assis e Fernando Pessoa só para você, leitor.

 

“Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um Corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nenhum momento,
Mas com ar sereno e lento pousou sobre os meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais.
     Foi, pousou, e nada mais.”

Ora, o que diabos corvos têm a ver com o que eu vou abordar; vos digo: tudo! E não estou me referindo nem mesmo a biologia, e sim a um problema filosófico: corvos pretos! É um problema lógico criado em 1965 por Carl Gustav Hempel, filósofo científico do século passado. Por se tratar de um problema bastante abstrato, não vou extender muito as explicações e tentarei ser bem prosaico.

O Corvo

Suponhamos que você esteja andando, por uma floresta talvez, e aviste um corvo. Ele é preto. ”— Veja só, este corvo é preto.” — você provavelmente diria. Após andar mais alguns metros, você avista um conjunto de 10 corvos, todos pretos. Você logo deve pensar “— Veja só que coindicência, estes 10 corvos também são pretos!”. Então você continua andando e avista muitos e muitos corvos por onde vai, todos pretos, e logo vai pensando; isso não deve ser uma mera coincidência. É aí que nasce a concepção científica. Você pensa um pouco e forma uma hipótese indutiva: todos os corvos são pretos. Sabemos que se torna impróprio observar todos os corvos para averiguar que são todos, de fato pretos. Isso inclui corvos que ainda não nasceram, corvos que morreram e corvos em locais que talvez nem se tenha conhecimento.

Ocorre então que cada evidência nova de um corvo preto corrobora com (1). Toda vez que vejo um corvo preto, essa análise me aproxima mais da conclusão de que todos os corvos são pretos. Analise também a sentença (2):

A=corvo e B=preto.

Carl Gustav Hempel
(1) (∀A)(A → B) (para todo A; A implica B).

:. Para todos os corvos (∀A);

Todos os corvos (A) são pretos (B). (Hipótese).

(2) (∀¬B)(¬B → ¬A) (para todo não-B; não-B implica não-A).

:. Para tudo o que não é preto (∀¬B);

Tudo o que não é preto (não-preto;¬B) não é corvo (não-corvo;¬A).

 

 

Pelos princípios da lógica, uma sentença é igual a sua contrapositiva. Em outras palavras, (∀A)(A → B) = (∀¬B)(¬B → ¬A). É aí que mora o problema. Se cada evidência de A implicando B (alguma coisa é corvo e portanto é preto) aproxima mais a conclusão de que (1) é verdadeira,  então a evidência de ¬B implicando em ¬A (alguma coisa não é preta e portanto não é corvo) também tem o mesmo efeito. É válido dizer por exemplo, que “minha caneta (não-corvo) é azul (não-preto)” corrobora com “todos os corvos são pretos” (observe que o fato de minha caneta ser azul é uma contrapositiva de todos os corvos serem pretos). Veja dessa forma.

(2) Tenho uma coisa azul (não-preto) que é minha caneta (não-corvo).

:. ¬B → ¬A.

Isso não se trata de um paradoxo em si. Mas mostra que se métodos indutivos procedessem de tal forma, qualquer banalidade aumentaria a chance de uma hipótese científica ser verdadeira.

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